Enquanto isso, ela descabelava-se sobre sua produção acadêmica, com esforço conseguiria terminar seu trabalho, mesmo que para isso levasse a noite inteira acordada, terminar aquele trabalho era uma questão de honra. O cansaço mental já dominava seu corpo e sua vontade era de jogar tudo pelos ares, resolveu tomar um banho, um banho quente a traria de volta daquele cansaço que a fazia desesperar-se.
Ele, com o intuito de enganar sua espera começou a contar quantas pessoas estavam antes de sua vez, avistou uma figura que estava quase para ser atendida que lhe pareceu familiar, observou bem e reconheceu, um velho amigo que há muito não falava. O observou ser atendido e o acompanhou com o olhar, parece que sentimos quando somos observados, e o seu amigo sentiu algo diferente, algo que pareceu lhe incomodar a ponto de fazer uma espécie rastreamento e os olhares se encontraram, um sorriso de cumplicidade surgiu, então se cumprimentaram como bons e velhos amigos fazem: “fala seu filho da puta”, “quanto tempo, porra”, “saudades de ti”. Trocaram lembranças e um e pergunta surgiu. Vais fazer o que? Só vim pagar uma conta, estou de bobeira. Espera-me então, só vou pagar essa conta aqui.
Uma boa companhia faz até o Domingão do Faustão suportável, enquanto esperavam sua vez, lembraram das promessas não cumpridas e surge o inevitável, o convite para continuar aquela agradável conversa no velho lugar de confidencias, o Café Bahia, lá poderiam aprimorar seu diálogo recheando-o com uma deliciosa porção de moela e a geladíssima Serra Malte, pagaram a conta e seguiram ao lugar que tantas vezes testemunhou suas confidencias.
Chegaram ao seu confessionário particular e não precisaram nada dizer, logo chega o garçom trazendo o de sempre e dizendo, estão sumidos. É amigo, a correria do dia-a-dia distancia até os amigos mais próximos, responderam ao garçom como que em coro de lamentação de estarem a tanto tempo sem suas confidencias.
No quarto, ela preparava-se para o banho, espreguiçou-se, retirou cada peça de roupa como quem prepara-se para um ritual sagrado, abriu o guarda roupa, retirou uma toalha e enrolou-se, preferia andar nua pela casa, mas as janelas indiscretas dos apartamentos a tiravam a liberdade. Antes de entrar no banheiro parou em frente ao espelho e admirou-se, abriu a toalha e admirou-se. Logo ao entrar no banheiro ligou a chave da água quente e em seguida a da água fria, aparou um pouco de água nas mãos em concha e molhou o rosto. Para testar se água estava na temperatura adequada colocou apenas um dos pés, esticou um pouco mais as pernas e aos pouco sentia a água descobrindo seu corpo. Ao entrar completamente debaixo daquela água quente, deixou que apenas a água caísse sobre ela, e, ergueu a cabeça como quem se entrega ao desejo de ser possuída.
Derramou o sabonete líquido nas mãos e suavemente passou sobre seu corpo, parte por parte, deslizou sobre seus seios, massageando descendo pelos quadris, as coxas, cada uma teve sua vez, abaixou e completou até os pés, voltando cada movimento até chegar ao pescoço. Suas mãos pareciam que modelavam cada parte de seu corpo, como um escultor modela a argila dando-lhe a forma desejada, seu desejo era de modelar a tranqüilidade que tanto necessitava e que aquele banho a permitia saborear: a água, o sabonete, suas mãos e seu corpo, tudo na medida certa. E, a tranqüilidade surgia.
No bar, os amigos caminhavam para pedida final, um brinde e o desfecho de mais uma confissão terminara no Café Bahia. Bom amigo, devo ir, disse ele, precisamos nos ver com mais freqüência, não podemos deixar que essa louca correria que a contemporaneidade nos impõe nos distancie mais que a própria distância geográfica já o faz. Antes que se despedisse completamente o amigo olhou para ele e disse: reparei desde que nos vimos na fila da lotérica que seu semblante está como quem acabara de ganhar o mais belo presente. Então respondeu: é que os amigos são como as primaveras, trazem alegria ao mundo. Ao encontrar-te naquele momento senti essa alegria trazida por você, pois, és uma constante primavera em minha vida.
Após tanto tempo de confidências, aquela fora a mais bela declaração ouvida por seu amigo. Um abraço apertado e então se despediram. Sabiam que talvez só o acaso pudesse trazê-los de volta ao seu confessionário particular. Afinal, quem está livre da correria imposta pela contemporaneidade?
Um comentário:
Nossa vc como sempre conseguiu fazer com que eu me perdesse na riqueza dos detalhes de sua narração...fiquei agora com mais saudades suas meu anjo...
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